domingo, 26 de março de 2017

É tiro!





Um tiro ecoou no escuro! Acordei assustado deixando no esquecimento a morena com quem dançava numa festa qualquer (afinal, sonho é sonho, o que importa é a morena e não os detalhes da festa). Ouvi sim um barulho forte, e certamente foi um tiro, como aqueles do tiroteio no assalto ao banco que vi ontem na TV antes de dormir. No auge dos meus 16 anos, nunca me vi tão indeciso: não sabia se me escondia debaixo da cama ou dentro do armário. Que vergonha era minha cara e minha tremedeira nas pernas! Ainda bem que eu estava sozinho. Que nada, eu não queria estar sozinho! Meu pensamento gritou o mais alto possível: Eu quero minha mãe!
Foi então que percebi que não deveria ter me recusado a visitar a tia Zilda junto com meus pais em Coité do Nóia lá em Alagoas. Como será que se chama quem nasce em Coité do Nóia? Só pode ser coiteense ou noiado. Pronto, o mundo acabou de ser destruído com um tiro e eu debaixo da cama procurando um adjetivo pátrio para nativos que estavam fora da zona de perigo.
Agucei os ouvidos. Silêncio total. Alguém morreu? Cadê a polícia? Ninguém vai socorrer o defunto? Pensando bem, não faz muita diferença, já morreu mesmo! E se o bandido resolver se esconder justamente aqui? E se fizer de mim, refém? Não! Preciso sair daqui! Sair pela porta de trás que vai dá de frente com a porta da cozinha da casa da Jandira, mulher madura, viúva e abundantemente bonita que toma sol na varanda todos os dias das 8: 15 às 9h em ponto. Necessito do socorro da Jandira! Afinal, tem um bandido prestes a entrar aqui! É justo!
Abri a porta do quarto, tudo escuro. Claro, não acendi a luz, chamaria a atenção do bandido. Caminhando de lado encostado na parede, cheguei na cozinha, liguei a lanterna do celular e vi...
Um copo estraçalhado no chão e meu gato siamês mais assustado do que eu.
Junto com os cacos de vidros foram para o lixo uma grande oportunidade de ser acolhido e protegido pela Jandira.

Zezinha Lins